A Queda de Saulo para Dar Espaço a Paulo
Na Via de Damasco, Deus passa a rasteira em Saulo. Joga por terra sua presunção religiosa, sua imagem distorcida de Deus e seus preconceitos contra os cristãos. Saulo achava que estava em sintonia com Deus e cumprindo rigorosamente a Sua vontade. Considerava-se um exemplo de “justiça” e um zeloso defensor de Deus. Na realidade, vagava nas trevas. No caminho de Damasco, ele fica cara a cara com Jesus, que lhe propõe um novo caminho à descoberta do verdadeiro rosto de Deus. A condição é deixar-se conduzir com confiança como um cego. Não é uma coisa fácil para quem sempre esteve acostumado a dirigir e mandar. A meta é a comunidade cristã, a mesma contra a qual estava prestes a soltar sua “ira religiosa”. É lá que Saulo terá de se apresentar para conhecer Jesus, o verdadeiro rosto de Deus, graças ao testemunho dos seus discípulos.
Mas, para que tudo isso aconteça, é necessário que haja outra conversão. Desta vez na comunidade cristã. Ananias, indicado pelo Espírito a instruir Saulo, também precisa mudar. Sua desconfiança com Saulo é grande. Ele conhece seu histórico de perseguidor. Não consegue confiar nele. É o perigo do sectarismo que gera intolerância e intransigência. A conversão de Saulo é mais um manifesto da liberdade de Deus e da universalidade de sua mensagem. Ele age quando e como quiser para o bem de todas as gentes, sem nenhuma distinção.
Na “Via de Damasco” caem por terra as expectativas dos “zelosos defensores” de Deus. Acontece um indiscutível posicionamento contra a intolerância religiosa, sobretudo quando, sob a aparente defesa dos “direitos” de Deus, se esconde um perverso plano de manipulá-lo e usá-lo para defender e proteger seus próprios interesses. Quem defende e promove a violência, mesmo se for supostamente em defesa dos “valores religiosos”, depõe contra Deus. Ele nunca se servirá do ódio e da intolerância para se defender e impor sua vontade. Já não aguenta mais quem vai à Igreja para “servi-lo”, “fortemente armado” física e ideologicamente e passando por cima da dignidade de seus filhos/as. Deus não quer setas aquarteladas em suas arrogantes convicções, mas comunidades de portas abertas, prontas a acolher e cuidar de todas as pessoas que chegam. Ananias acolhe Saulo, lhe impõe as mãos e lhe transmite o Espírito de Jesus de Nazaré. Nesse exato momento, as escamas caem dos seus olhos. “Acho que as escamas de Saulo eram suas supostas perfeições, sua ideologia religiosa, sua intransigência e intolerância” (Silvano Fausti). Então ele recupera a visão e é batizado. A partir deste momento, torna-se o apóstolo Paulo. Depois de alguns dias, ele já está falando de Jesus. Já não consegue conter o desejo de contar o que lhe aconteceu. Deus converte Saulo e o envolve no caminho de Jesus. Ananias, por sua vez, é convertido de sua desconfiança e se deixa envolver como companheiro nesta nova jornada que Saulo está prestes a empreender. Destas conversões nasce Paulo, apóstolo dos gentios, e surge uma nova comunidade cada vez mais empenhada em acolher todos aqueles que, independentemente de suas histórias, têm um desejo louco de conhecer Jesus e de dá-lo a conhecer aos outros.
(Pe. Xavier Paolillo, Missionário Comboniano)