
Campanha da Fraternidade 2023: “Fraternidade e fome” — “Dai-lhes vós mesmos de comer” (Mt 14,16)
Parece impensável que em pleno 2023 a Campanha da Fraternidade precise abordar o tema da fome em nosso país! Mas está é realmente a situação a ser debatida e enfrentada como uma dura realidade que voltou fortemente nos últimos anos. O Texto-Base da Campanha da Fraternidade 2023 traz como tema a “Fraternidade e Fome” e o lema bíblico “Dai-lhes vós mesmos de comer!” (Mt 14,16).
Comer é um dos atos mais fundamentais de todos os seres vivos e a primeira preocupação do ser humano. Da mesma forma a fome é uma das necessidades mais básicas a ser enfrentada. Assim como a vida, a comida é dom de Deus. Absurdamente na mesa existem diferenças, onde muitos ficam com fome enquanto poucos comem em abundância e desperdício. “A diferença em relação à comida é imagem perfeita das relações sociais” (J. Comblin) A fome é um absurdo! E o convite é para que nesta quaresma e durante todo o ano a Campanha da Fraternidade nos ajude em nosso processo de conversão pessoal, comunitário e social.
Infelizmente a temática da fome já foi tratada em uma CF pela Igreja no Brasil. O tema foi abordado pela Igreja na Campanha de 1985 com o lema “Pão para quem tem fome” apresentando o cenário da fome como um problema crucial a ser enfrentado. Passados tantos anos temos um cenário semelhante, com as pessoas em situação de insegurança e vulnerabilidade social.
Na Encíclica Fratelli Tutti, o Papa Francisco sinaliza para o escândalo da fome: “As graves crises políticas, a injustiça e a falta de uma distribuição equitativa dos recursos naturais (…). A respeito de tais crises que fazem morrer à fome milhões de crianças, já reduzidas a esqueletos humanos por causa da pobreza e da fome, reina um inaceitável silêncio internacional” (n.29).
O documento adverte ainda que “(…) a política mundial não pode deixar de colocar entre seus objetivos principais e irrenunciáveis o de eliminar efetivamente a fome. Com efeito, “quando a especulação financeira condiciona o preço dos alimentos, tratando-os como uma mercadoria qualquer, milhões de pessoas sofrem e morrem de fome. Por outro lado, descartam-se toneladas de alimentos. Isto constitui um verdadeiro escândalo. A fome é criminosa, a alimentação é um direito inalienável” (n.189).
A Campanha da Fraternidade e o tema proposto sem dúvida é um momento forte para a reflexão e um convite para repartir o pão com os necessitados. Mas é oportunidade única de ajudar na organização de políticas públicas inclusivas, resgatando o grande objetivo da Campanha da Fraternidade que é “despertar a solidariedade nos fiéis e na sociedade em relação a um problema concreto que envolve a sociedade brasileira, buscando caminhos de solução à luz do Evangelho”.
Por isso é importante nos questionarmos: – Sentimos a realidade da fome do povo ou já a normalizamos? Esta realidade pode ser apenas um tema a ser discutido ou de fato nos solidarizamos concretamente com quem está passando por esta situação? Temos vivido as nossas refeições como momentos de reconhecimento deste dom de Deus para nós e como forma de comunhão? Sem dúvida precisamos refletir sobre nossa maneira de agir com os que nos pedem comida e nossa forma de compartilhar, mas sobretudo é preciso aprofundar suas causas.
Assim, o maior desafio da CF2023 é ir além de um assistencialismo imediatista, que resolve o momento, e que tem também a sua importância, entretanto não soluciona a situação. Dom Hélder Câmara tem uma conhecida frase onde diz “se alimento aos pobres me chamam de santo. Se pergunto o motivo de terem fome me chamam de comunista”. Mas Francisco esclarece: “não é comunismo, é Evangelho”! Basta olhar para Jo 10,10 “eu vim para que todos tenham vida, e vida em abundância”. Então, a fome não é vida, mas gera a morte. Desse modo combater a origem da fome faz parte também do chamado que nos faz o lema dessa Campanha.
Cristina e Flávio, Leigos Combonianos