“EFFATÁ!”. ABRE-TE!”
Eis ainda uma vez um milagre que precisa ser lido também como uma parábola. O que Jesus faz com o surdo-mudo (Mc 7,31-37) é exatamente aquilo que gostaria de realizar com cada um/a de seus discípulos e discípulas, sobretudo com quem anda travado/a em si mesmo/a e tem dificuldade de abrir-se totalmente à ação do Espírito e à vivência da Caridade.
O primeiro ato é pegá-lo pela mão, afastá-lo da multidão e conduzi-lo a parte para um atendimento personalizado. É uma conversa cara a cara, olho no olho, com poucas palavras e muitos gestos. É um diálogo criativo onde os dedos trabalham mais do que o boca. É uma sessão de remodelagem durante a qual o Criador acolhe em suas mãos a vida ferida que lhe está diante e a remodela com a mesma maestria com que o oleiro manuseia o barro até chegar a produzir sua obra prima. Através de calor de suas mãos, da ternura de seus gestos e seu sopro vital Ele cura o ser humano devolvendo-lhe a beleza e dignidade originárias. Esta é sua maior alegria: a felicidade das pessoas com acesso à vida em plenitude. Através da cura Jesus conduz o ser humano à verdadeira liberdade. Do encontro com Ele a pessoa que vivia aprisionada no silêncio e que precisava da bondade dos outros para ter um mínimo de dignidade, agora sai andando com suas próprias pernas.
Em todo esse ritual só tem um Palavra: “Effatá!”. É em aramaico, a língua materna. Pois Deus não fala línguas estranhas, mas se expressa com a linguagem do povo que todo mundo entende. “Abre-te”. Basta uma só palavra. Pois Deus é de Palavra. É uma ordem soprada com a mesma intensidade daquela pronunciada por Deus na hora da criação. Contém a mesma energia criativa. É um grito de liberdade que “canta” como um “alvará de soltura” que chega após uma vida inteira passada atrás das grades. “Abre-te a Deus e aos outros!”. Pois só uma vida de portas abertas é uma vida curada. Escuta é o primeiro ato de fé. “É a operação primária do ser humano diante de Deus, tanto que podemos dizer que se do ponto de vista de Deus “no início estava a Palavra, e a Palavra estava com Deus, e a Palavra era Deus” (Jn 1:1), do ponto de vista do ser humano “no início está a escuta” (Enzo Bianchi). Escutar é também o melhor serviço que podemos prestar aos outros, mas nem sempre o valorizamos. Frquentamos cursos de oratória para aprender a falar bem, mas neglicenciamos a arte de “bem escutar”. É a escuta com o coração. É parte essencial do cuidado. Exige aprendizagem, paciência e sabedoria. É uma arte que requer também bondade, humildade e abertura ao outro. Quem sabe escutar o outro com atenção consegue falar melhor, de maneira mais adequada, mais precisa, mais serena e, por último, mais sábia.
Ao contrário, quem não sabe escutar perde o direito de falar. Torna-se mudo. Sua palavra não toca o coração de ninguém. Talvez o nosso dizer pouco ou o não conseguir falar ao mundo são consequências da nossa incapacidade de escutar (Ermes Ronchi). “Escuta a Palavra não só com os ouvidos, mas sobretudo com o coração!”. Dessa forma “as feridas se tornam brechas por onde entra e a sai a vida” (Ermes Ronchi). Só quem escuta com o coração aprende a falar a linguagem da caridade que se expressa mais com gestos de que com chatos sermões e conversas fiadas. Só assim o ser humano passa a viver de verdade e em liberdade.
Diante disso, assim como fez o Rei Salomão (1Reis 3,9), peçamos a graça de um coração sábio que seja capaz de ouvir para que, à luz de Sua Palavra, possamos discernir com sabedoria a realidade e intervir nela conforme Sua vontade.
Santa Escolástica, cuja memória celebramos hoje, nos ajude a escolher a “melhor parte”, que é permanecer com Jesus para escutar Sua Palavra qualquer que seja a atividade que estamos realizando. Tenham um dia abençoado.
(pe. Xavier Paolillo, missionário comboniano)