
Ele virá, tirará a vinha das mãos dos “vinhateiros homicidas” e a entregará aos cuidados de outros/as
A polêmica entre Jesus e as autoridades religiosas da sua época se faz cada vez mais tensa. Fica exposta, sem meios termos, na parábola dos vinhateiros homicidas (Mc 12,1-12), uma alegoria que remete a imagens características da tradição bíblica do Antigo Testamento, especialmente ao famoso “canto da vinha” de Isaías (5:1-7).
O Senhor planta a vinha com todo cuidado e, tendo que viajar, a arrenda a alguns agricultores. Na época da colheita, manda seus empregados aos agricultores para receber a sua parte dos frutos da vinha. Mas os agricultores pegam os empregados, batem neles e os mandam de volta sem nada. O dono insiste com outros empregados, e eles os matam. Então o dono envia seu Filho Amado, achando que vão ter respeito por ele. Mas os agricultores, com o intuito de ficar com a herança, agarram o filho, o matam e o jogam fora da vinha.
O texto não deixa dúvidas. É de uma transparência escancarada. sublinhada pelo próprio evangelista no final do texto: “Então os chefes dos judeus procuraram prender Jesus, pois, compreenderam que havia contado a parábola para eles”.
A “vinha” é o Reino de Deus, os servos são os profetas, o Mestre-Senhor é Deus, os vinhateiros são Israel e seus líderes, o fruto é a fidelidade à Aliança. O dono da vinha (Deus) não cessa de confiar em seu povo e envia, várias vezes, os seus servos (os profetas) para pedir o fruto que espera de sua vinha: justiça, paz, misericórdia, verdade, amor… Todavia, as lideranças religiosas infiéis se apoderam da vinha e a exploram conforme seus interesses. Rechaçam e matam os profetas. Por causa de sua maldade, aquela que devia ser uma história de vida marcada pela alegria e a festa, se transforma numa tragédia com derramamento de sangue inocente. Deus, porém, não desiste. Por quanto grande seja a Sua decepção diante da ingratidão e da infidelidade humana, manda, por último, Seu filho único, a quem muito amava, dizendo: “Eles terão respeito pelo meu filho! “. Os dirigentes o reconhecem, sabem que é o herdeiro e, mesmo assim, decidem não só matá-lo, mas apagar do povo a memória dele (lançaram-no fora da vinha). O relato é de uma atualidade impressionante. É a mesma coisa que vem acontecendo hoje. Incomodadas com a força libertadora do Evangelho, lideranças “religiosas” fazem de tudo para “eliminar Jesus”, amenizar sua Palavra e até substituí-la com tradições e práticas “religiosas’ que nada tem a ver com o estilo de vida proposto por Ele.
“O que fará então o dono da vinha”. Os relatos bíblicos anteriores já ofereciam uma resposta: Deus condena quem abusa do poder religioso para manipular e oprimir o povo. Mas agora há uma novidade inesperada: não só se prevê a punição dos responsáveis, como se anuncia que o plano de Deus será confiado a “outros”. “Ele virá e exterminará os vinhateiros e dará a vinha a outros.” Com a morte e ressurreição de Jesus, a exclusividade e os privilégios do “povo eleito” são superados e a salvação é oferecida a todos, até mesmo aos pagãos. Isso vale para todos os tempos, até mesmo para o nosso. O estilo de ação de Deus também desafia as comunidades cristãs que afirmam ter o monopólio do Reino de Deus. A única garantia verdadeira é a fidelidade ao Evangelho. A vinha do Senhor é aquela que está solidamente fundada em Jesus de Nazaré. “A pedra que os construtores rejeitaram veio a tornar-se a pedra angular”. Deus intervém para salvar sua vinha ressuscitando seu Filho amado e transformando-o em pedra angular do novo povo de Deus. Jesus é a videira verdadeira (Jo 15,1-8), a única que tem a exclusividade de dar os frutos que o Pai espera ansiosamente. O seu Evangelho é a seiva que traz a alegria que preenche o vazio de nossas vidas e produz justiça e paz. Erradicar-se da cultura da morte e enxertar-se n’Ele é a única possibilidade de dar os frutos conformes as expectativas do Pai. À diferença dos vinhateiros malvados que depredam a vinha, se apoderam dos frutos para alimentar seus interesses e deixam rastos de morte, Jesus cuida e gera vida em abundância doando sua própria vida. Só quem permanece n’Ele e se entrega aos seus cuidados, deixa de ser um galho seco, estéril ou, pior ainda, venenoso e passa a fazer parte da vinha do Senhor que faz a alegria do mundo com a abundância de seus bons frutos. Vamos nessa!
(Pe. Xavier Paolillo, missionário comboniano)