
Esbanjando Evangelho
“Um semeador saiu a semear!”. Começa assim uma das mais bonitas lições de Jesus sobre o Reinado de Deus (Mt 13,1-9). Uma cena tirada da vida ordinária dos/as trabalhadores/as rurais transforma-se numa página de teologia popular acessível a todos/as. Para falar de Deus e de seu jeito de agir na história, Jesus não usa conceitos abstratos, mas a vida concreta do homem e da mulher do campo. Para encontrar Deus não precisa escalar o Céu e ficar com a cabeça entre nuvens. Basta contemplar as dinâmicas da terra, pois é aí que Ele marca presença e se revela.
“Um semeador saiu a semear” é uma expressão carregada de confiança, promessas e esperanças. Narra de um Deus incansável, que sai toda hora ao encontro do ser humano, qualquer que seja sua condição, e não desiste nunca de fazer acontecer Seu Reinado de Amor. À primeira vista parece doido. Sua atuação beira a irresponsabilidade. Seu jeito de semear dá prejuízo para quem contém gastos para conseguir mais lucro. Espalha a semente de qualquer jeito e em qualquer chão. Na lógica mercantilista do agronegócio isto é desperdício. Já teria perdido o emprego. Mas é mesmo este “desperdício” que faz a diferença de Deus. Na “agricultura familiar do Pai” vigora a economia do amor. A semeadura prevalece sobre a colheita. Doar sem limites a todos/as sem distinção é mais importante do que receber. Deus confia demasiadamente em Sua Palavra e no ser humano. Sai toda hora para semear, pois está convencido de que a Palavra não voltará para Ele sem dar fruto. A semente que espalha com abundância promete bem. Contém o germe da esperança. As suas intrínsecas potencialidades podem vencer as condições adversas. O Seu Reinado vai vingar, apesar do “chão batido da beira da estrada” que impede sua assimilação, das pedras que atrapalham a perseverança e dos espinhos que o sufocam. A despeito de quem gosta de choramingar o tempo todo e de sublinhar os fracassos, a boa notícia é que tem sempre um “pedacinho de chão” que o acolhe e lhe oferece as condições para dar fruto.
A generosidade de Deus que beira o “desperdício” questiona nossas práticas pastorais. Ensina-nos que, em matéria de evangelização, precisa investir tudo sem se poupar e sem prestar demasiada atenção nos resultados. O anúncio do Evangelho não pode ser condicionado pela aceitação que lhe será reservada. A generosidade da semeadura nunca pode ser condicionada pela previsão de um resultado negativo. Não dá para desistir de anunciar e testemunhar o Evangelho porque “já não vale mais pena”, “não adianta” ou “está tudo perdido”. A extrema generosidade de Deus para com o ser humano na hora de semear a semente do seu Reino em qualquer terreno questiona a nossa mania de organizar tudo, de calcular se vale a pena o investimento, de rotular as pessoas, classificar as situações e decretar exclusões. O/a cristão/ã não está no mundo para isolar-se, mas para inserir-se nele assim como a Palavra que se faz semente e aceita cair em qualquer chão. Para Jesus, a semente da Palavra só se perde verdadeiramente quando permanece nas mãos fechadas de um/a semeador/a racionalista e calculista, que não sai para semear por medo de pôr em perigo a própria Palavra e de se arriscar.
Hoje celebramos a memória de São Joaquim e Santa Ana. Em nome deles, agradecemos todas as pessoas idosas que, ao longo da vida, semearam generosamente os valores do Evangelho. Seus gestos de bondade nunca serão esquecidos.
(Pe. Xavier Paolillo, missionário comboniano)