Jesus é sinal de Contradição
Todo “religioso” sonha com a igreja lotada. É evidente que isso é bom se a monte tem a firme decisão de seguir Jesus e pautar a vida nos valores do Evangelho. O problema é quando, para lotar a Igreja, inventamos modas e, seguindo as leis do mercado, descuidamos da “qualidade do produto”, priorizamos o lucro, operamos cortes e usamos “efeitos especiais”, “descontos”, “promoções” e “vantagens” para atrair a clientela e fazer seu gosto. Um dos artifícios mais utilizados hoje em dia para este fim é o uso abusivo do milagre. Multidões de fiéis frequentam igrejas não para ouvir Deus e fazer sua vontade, mas para resolver seus problemas pessoais e familiares, como doenças, dívidas e conflitos. Há quem procure uma solução milagrosa até para emagrecer. Deus torna-se um prestigiador que resolve todos os problemas com a varinha mágica. O pior é que para ter acesso a Ele, alguns cobram. O milagre e a bênção são proporcionais ao valor da “oferta” ou da “promessa”. Nisso não tem “graça”, mas só comércio. Nada contra em pedir ajuda ao Pai nas horas do sufoco, mas a busca obsessiva e equivocada do milagre deslumbrante e sensacionalista pode se tornar o pior inimigo do Reino de Deus. que se acolhe somente pela fé (Bíblia Ave Maria).
Jesus rejeitou o messianismo tradicional. Negou-se sistematicamente a atrair o povo através de portentos milagrosos. Deixou isso bem claro desde o início da sua missão quando se retirou no deserto e enfrentou as tentações. Naquela oportunidade e durante toda a sua vida terrena recusou-se a usar o milagre como manifestação de poder e como moeda de troca. Queixou-se das pessoas que o seguiam e que exigiam provas concretas para acreditar n’Ele. Após a multiplicação dos pães e dos peixes, rejeitou a vontade do povo que queria empossá-lo como rei. Ficou mudo diante de Herodes que “esperava presenciar algum milagre operado por ele”. Jesus deixou bem claro que a fé não depende de sinais. É o sinal que depende da fé, pois só ela é capaz de captar a ação de Deus na realidade humana e de ver Sua presença além da própria realidade. Se não há fé, não vale a pena pedir outros sinais, porque eles não serão reconhecidos como tais. Para ver os sinais de Deus na nossa vida quotidiana, devemos recorrer à Sagrada Escritura. Somente a Palavra de Deus pode iluminar nosso olhar sobre a maneira de ler e julgar a realidade para enxergar nela a ação de Deus. Foi isso que Jesus fez quando propôs aos fariseus como único sinal os testemunhos de Jonas e da rainha do sul, que são justamente a negação de todo espetáculo milagroso. Quem não conhece as Escrituras não pode alimentar e educar sua fé e, portanto, será cego, incapaz de ver os sinais da ação de Deus em sua vida.
O que nos ensina o sinal de Jonas e da rainha do sul? Revela uma grande contradição que desmascara a dureza do coração de quem se achava certo. Enquanto os escribas e fariseus não têm olhos para ver em Jesus humilde, supliciado e morto na cruz a presença do Reinado de Deus, os pobres e os pagãos aderem a Ele sem condições. Sem buscar sinais extraordinários e provas contundentes, confiam em Deus e colocam-se a caminho atrás d’Aquele que pode salvá-los. Jonas, mesmo resistindo com todas suas forças ao chamado de Deus, colocou o pé na estrada e voltou a Nínive para pregar a conversão dos pagãos. Estes, somente pela Sua Palavra, aceitaram mudar de vida. A rainha do sul, por sua vez, optou, por iniciativa própria, por empreender uma longa viagem para se colocar na escola da sabedoria de Salomão. Agora os fariseus e os escribas têm mais do que Jonas e Salomão. O grande sinal é o próprio Jesus, Jonas e a rainha do sul ensinam que para acolher o Senhor como sinal de Deus é preciso deixar-se desestabilizar por Ele, abandonando tudo aquilo que nos impede de caminhar atrás dele. Não raramente, como aconteceu com o povo de Israel no deserto, preferimos permanecer escravos a desfrutar da experiência emocionante e exigente da liberdade (Antônio Savone).
Deus nunca se impõe com milagres extraordinários, mas pede para ser reconhecido e acolhido através dos sinais humildes e pobres com que cuida do nosso caminho. “Bem-aventurado aquele que não se escandaliza comigo”, dirá Jesus. O Crucificado é o grande sinal do amor de Deus para conosco. É olhando para Ele que somos salvos. O caminho feito pela Rainha do Sul e Jonas indica como a chegada a essa aceitação dos sinais de Deus requer um longo tempo e uma jornada cansativa. Não existe pior coxo do que aquele que não quer andar e pior cego do que aquele que não quer ver.
(Pe. Xavier Paolillo, missionário comboniano)