“Não julgueis!” (Mt 7,1-5)
O Mestre é categórico. Usa o imperativo presente para afirmar, uma vez por todas, que chegou a hora de parar de julgar os outros. Esta é uma atividade exclusiva de Deus. Ele conhece bem o ser humano e é o único capaz de sondar as suas reais intenções. “O seu juízo é oposto ao nosso. É a Cruz. O que Deus faz na Cruz? Ele dá a vida por aqueles que o matam. Este é o julgamento de Deus. Deus tem uma estima infinita por cada ser humano, mesmo pelo pecador. O mais perdido vale a vida de Deus. Porque Ele ama. E, portanto, tem sempre um bom e positivo julgamento. É o meu egoísmo que me faz julgar negativamente o outro, me leva a ver só o mal, a desqualificar a pessoa e a condená-la” (Pe. Silvano Fausti). Mesmo a necessária correção fraterna só pode ser feita se estiver inspirada na nova justiça que o Reino de Deus trouxe: a misericórdia. Certas posturas que aparentam ser manifestações de zelo cristão muitas vezes são o oposto da compaixão e da misericórdia, que são as virtudes típicas do cristão. Corrigir quem erra é uma dimensão importante do processo educativo e é uma responsabilidade do/a cristão/ã. O próprio Jesus corrige os discípulos toda vez que pensam e fazem alguma coisa errada. “As correções – dizia Santo Ambrósio – fazem bem e são de maior proveito que uma amizade muda. Se o amigo se sentir ofendido, corrige-o mesmo assim; insiste sem medo, mesmo que o sabor amargo da correção o desgoste. Está escrito no livro dos Provérbios que as feridas provocadas por um amigo são mais toleráveis que os beijos dos aduladores (Pr 27,6). Corrigir o/a outro/a é expressão de amizade e de franqueza. É traço que distingue o/a adulador/a do/a amigo/a verdadeiro/a. Deixar-se corrigir, por sua vez, é sinal de maturidade e condição importante para o próprio crescimento. Quem prefere silenciar e omitir a correção – escrevia santo Agostinho – é pior de quem está precisando de correção por ter errado.
Tudo isso, porém, tem sentido se o ato de corrigir brota do Amor, seja como motivação seja como modalidade. Corrige-se por amor e com amor. Na lógica do amor é inadmissível a correção violenta, humilhante, constrangedora e destruidora da dignidade da pessoa que erra. Não tem matiz cristã a correção que tem origem no desejo de vingança, na irritação por uma ofensa recebida, nem na soberba ou vaidade feridas por faltas alheias. A correção fraterna deve estar cheia de delicadeza e de caridade.
Cuidado, na hora de julgar e condenar os outros, pois seremos medidos com a mesma medida com que medimos, alerta Jesus. Ao condenar os outros, estaremos condenando a nós mesmo, até porque, como a própria psicologia nos ensina, os defeitos dos outros que mais nos irritam são normalmente nossos próprios defeitos que detestamos nos outros e não em nós mesmos. É bom dar uma boa calibrada no nosso olhar. As “cataratas da maldade” só se curam à luz da misericórdia de Deus. Se mesmo queremos “rivalizar” entre nós, no lugar de ficar competindo apontando os defeitos alheios, concorramos em estimarmo-nos reciprocamente. “Amai-vos mutuamente com afeição terna e fraternal. Adiantai-vos em estimar-vos uns aos outros” diz o apóstolo Paulo (Rm 12,10) A humildade nos ensine a considerar os outros superiores a nós (Fl 2,3). Porque amar significa reconhecer o valor do/a outro/a, mesmo quando aparecem os defeitos.
Lembremo-nos que somos humanos/as. Todos/as podemos errar. A consciência das nossas fragilidades nos ajude a ter compreensão. Deus nos conceda o dom da misericórdia quando aparece a tentação de julgar, o dom da caridade na hora de corrigir e o dom da humildade na hora de sermos corrigidos/as.
(pe. Xavier Paolillo, missionário comboniano)