O Desafio da Vida Não É Escolher Entre Lícito e Ilícito, Mas Entre Amar e Não Amar
Aconteceu que, num dia de sábado, Jesus foi comer na casa de um dos chefes dos fariseus. E eles o observavam. Diante de Jesus havia um homem hidrópico. A hidropisia é uma patologia definida pelo acúmulo de líquido nos tecidos ou em cavidades corporais que provoca inchaços em várias partes do corpo. O hidrópico está sempre com muita sede, mas há algo dentro dele que não funciona, então tudo o que ele come e bebe, em vez de se tornar vida, o infla de morte. Pronto. O diagnóstico daquele homem é prato cheio para Jesus. Os fariseus que o haviam convidado com o propósito de armar-lhe uma cilada, acabam dando um tiro no próprio pé. A presença do hidrópico dá a Jesus a oportunidade de desmascará-los. A pior hidropisia não é aquela física padecida por aquele homem convidado com a intenção de flagrar Jesus transgredindo as prescrições do sábado, mas é aquela do dono da casa, cujo nome não é citado, justamente porque não representa só a si mesmo, mas todas as pessoas que seguem uma religiosidade legalista que não combina com a proposta do Evangelho. A pior enfermidade é o inchaço provocado pelo fermento dos fariseus. É o inchaço da hipocrisia, do protagonismo, do selfismo, do culto pela aparência, da busca obsessiva pelos primeiros lugares, até na hora de fazer o bem. O hidrópico é o espelho para quem se acha justo, anda de nariz empinado e se sente no direito de julgar e condenar os outros. O verdadeiro hidrópico é o fariseu porque é narcisista, autorreferencial, mesmo na vida espiritual! Não é que ele seja uma pessoa vulgar, má e indecente, mas porque é egocêntrica. O seu Deus é basicamente seu ego. Basta a si mesmo. Tem a presunção de salvar-se sozinho. Mas não é assim. É Deus que conta. É Ele que nos ama por primeiro. É Ele que nos salva e opera em nós maravilhas. A hidropisia farisaica é um mal difícil de curar. Enquanto o homem hidrópico se desincha rapidamente, o fariseu continua cheio de si mesmo e blindado em suas convicções. Enquanto o doente físico agarra a mão estendida de Jesus e fica curado, o fariseu, cheio de si mesmo, usa sua mão para agarrar Jesus e matá-lo. O Mestre vai tentar nos próximos capítulos murchar o orgulho e a presunção religiosa dos fariseus, mas não vai ser fácil. A fórmula da cura está na Sua pergunta: “A Lei permite curar em dia de sábado ou não?”. O remédio ao inchaço da arrogância legalista está no esvaziar-se para servir e curar. O dilema da vida não está na escolha entre lícito e ilícito, legal e ilegal, mas entre amar e não amar, cuidar e descuidar. O fariseu se afoga em seu próprio ego, como Narciso na fonte, porque não ama. Até quando ama demasiadamente a si mesmo, não está se amando, porque se priva da principal dimensão do ser humano, da razão de sua felicidade que é doar-se, viver com os outros e para os outros. Quando ele não cuida das pessoas, é ele que cai no poço de seu egoísmo, onde, por causa do peso de sua arrogância, afoga-se em sua própria água, assim como o hidrópico adoece pela água que bebe. Ao apresentar a Lei do Amor, Jesus quer tirar o ser humano do poço do legalismo e do moralismo. Ele quer nos arrancar da nossa justiça para nos trazer de volta para a liberdade dos filhos de Deus, só assim é sábado, só assim é festa, só assim é Páscoa. Mas os fariseus preferem o silêncio. Não respondem à pergunta de Jesus. Não querem admitir sua hidropisia. Se eles o fizessem, seriam imediatamente curados. Como já fizeram em outras oportunidades, talvez dissessem que não havia urgência. Que podia esperar o dia seguinte, depois do sábado. Não, não dá para esperar, assim como eles não esperam quando cai um filho ou um boi no poço. O risco de afogar é muito grande. O amor não espera, sobretudo quando a vida corre risco. O amor combina com urgência, a mesma que usamos quando quem precisa de amor conta, pois para nós cristãos, todas as vidas importam.
(Pe. Xavier Paolillo, missionário comboniano)