O EVANGELHO DA PAZ
“Em qualquer casa em que entrardes, dizei primeiro: A paz esteja nesta casa! Se ali morar um amigo da paz, a vossa paz repousará sobre ele; se não voltará para vós” (Lc 10,1-9)
Essa frase, aparentemente enigmática é fundamental. Pode ser o critério para avaliar as motivações das nossas ações. A ordem de Jesus a seus discípulos é andar com sobriedade e liberdade pelo mundo afora para levar o Evangelho da Paz. Mas, apesar de ser um dom que toda casa gostaria de receber, paradoxalmente nem sempre encontra pronta acolhida. No caminho dos/as missionários/as nem todo mundo é “amigo da paz”. A experiência da rejeição e do fracasso é possível e muito mais frequente daquilo que pensamos. Jesus não cria ilusões com falsas promessas. Deixa bem claro desde o início que a vida dos/as missionários/as não vai ser fácil. Mas, mesmo sabendo que os envia como cordeiros para o meio dos lobos, pede que não carreguem nem o bastão para se defenderem. O recado é claro; o mundo novo que Ele veio inaugurar não se constrói com a violência. A única força do/a discípulo é o Espírito: “Deus – diz Paulo a Timóteo – não nos deu um espírito de timidez, mas de fortaleza, de amor e sobriedade” (2Tm 1,7). Não há necessidade de se aliar com os poderosos deste mundo ou bajular quem que têm muito dinheiro para proclamar o Evangelho. Quando as comunidades cristãs cedem a esta tentação, tornam-se reféns de interesses que contradizem o Espírito do Evangelho. Elas perdem credibilidade quando se apegam aos bens materiais e buscam alianças com os poderosos que acumulam dinheiro e poder através de estratégias minadas pela violência. Ao contrário, tornam-se mais santas e críveis quando são perseguidas pelos poderes deste mundo.
Os/as discípulos/as de Jesus encaram o mundo com O Evangelho da Paz. Infelizmente, diante do contexto estruturalmente violento em que vivemos é comum acovardar-se, desistir ou, pior ainda, tornar-se lobo para sobreviver no meio de lobos. Trata-se de uma perigosa armadilha. Não dá para vencer o mal com as mesmas estratégias e armas do mal. A opção pela violência pode até trazer resultados imediatos, mas a longo prazo nos transforma no que odiamos. A verdadeira força do cristão é sua inabalável opção pelo bem e pela paz assim como faz Jesus, sobretudo quando é pregado na cruz. Mesmo cercado por “lobos”, não desiste e nem recorre à violência. Permanece “cordeiro” até às últimas consequências. À primeira vista parece até uma atitude covarde, uma manifestação de resignação e de impotência. Na realidade, a sua firme decisão de não recorrer à força para se defender aponta para o perdão e o amor incondicionado como as únicas forças capazes de derrotar o mal e de quebrar definitivamente a espiral da violência.
Se a rejeição, a ingratidão, as vaias e as perseguições que eventualmente experimentamos durante nossa atividade pastoral, além de suscitarem uma normal tristeza, nos arrancam a paz, nos tornam agressivos/as, nos afundam na depressão ou nos estimulam a chutar o pau da barraca e a largar tudo, então pode significar que talvez nossa atuação não seja totalmente livre, gratuita e desinteressada. Estamos mais preocupados conosco do que com o Evangelho. Buscamos um retorno para nós, um afago ao nosso “ego”, um reconhecimento à nossa pessoa, um elogio a nossas habilidades e o prêmio merecido. (pe. Vincenzo Marinelli).
Se agimos por Deus, mesmo se o bem que fazemos e a paz que anunciamos são reprovados, questionados e rejeitados continuemos em paz, pois afinal estamos fazendo exatamente o que Jesus nos pede. Ficar em paz mesmo no meio de um contexto de violências, decepções e frustrações é sintoma de que estamos agindo de graça, de maneira desinteressada e por puro amor a Deus. Não nos envergonhemos, portanto, do testemunho de nosso Senhor, nem dos fracassos e perseguições que eventualmente aparecem ao longo da aventura missionária, mas sofremos com serenidade pelo Evangelho, fortificados pelo poder de Deus (2Timóteo 18). A exemplo de São Tito e São Timóteo, discípulos do apóstolo Paulo, coloquemo-nos a serviço do anúncio do Evangelho com absoluta gratuidade e a paz, com certeza, voltará para nós e permanecerá em nós.
(pe. Xavier Paolillo, missionário comboniano)