O Olhar que Cura e Liberta!
“Antes que Felipe te chamasse, Eu te vi!”. A afirmação é de Jesus. Descortina horizontes até então desconhecidos. Faz parte do diálogo com Natanael, também identificado como Bartolomeu, cuja festa celebramos hoje. (Jo 1,4-51). A cena acontece na Galileia, região ao norte de Israel, a mais distante de Jerusalém, capital do Estado, onde se concentrava a aristocracia econômica e religiosa. É lá que Jesus decide de ir para chamar seus primeiros colaboradores. A decisão do Mestre gera perplexidade. A Galileia não goza de uma boa fama. É uma região pobre, periférica, marginal, com um papel insignificante no contexto geral do Reino de Israel. O povo está acostumado a ser desprezado. Já assimilou à condição de minoridade. Naturalizou a discriminação. Conformou-se com ela como se fosse um destino inelutável. Isso fica claro no complexo de inferioridade que aflora da resposta que Natanael dá a Felipe quando este compartilha o encontro com Jesus de Nazaré e o convida a conhecê-lo: “De Nazaré – questiona – pode sair coisa boa?”. Natanael, bom conhecedor da Sagrada Escritura, é vítima também do preconceito.
Mas Jesus, ao ver Natanael indo ao seu encontro, o surpreende com um elogio: “Aí vem um israelita de verdade, um homem sem falsidade”. Natanael fica atordoado. Talvez fosse a primeira vez que alguém o elogiasse. Jesus para ele é um desconhecido. Inclusive, por ser de Nazaré, é impossível que seja o Messias. Desconfia que se trate de um impostor e que seu elogio não passe de uma bajulação ou aliciamento.
Jesus não se irrita e não se ofende com os preconceitos e as dúvidas de Natanael. O seu elogio é sincero. Nasce de um jeito diferente de olhar as pessoas: “Antes que Felipe te chamasse, eu te vi”. Este é o segredo de Jesus. Lá onde a maioria não enxerga nada que preste, Ele vê o lado positivo. O seu olhar, como todas as Suas ações, tem tudo a ver o verbo amar. Jesus não vê simplesmente, Ele ama com os olhos, assim como ama com a boca, com os ouvidos, com as mãos, com a inteligência, com a vontade, em suma, com todo o seu ser. Amar com os olhos é ir além das aparências, descer em profundidade, derrubando preconceitos, passando por cima de discriminações, limpando o caminho de todas as sujeiras para chegar até o tesouro escondido, a pérola preciosa que está guardada em todos os corações, até naqueles que aparentam não ter mais jeito. O olhar de Jesus liberta Natanael. Desata-o das dúvidas e, sobretudo do complexo de inferioridade. Cura seus olhos das cataratas do “já não tenho jeito”, “não tenho nada que preste” estratificadas pelos olhares preconceituosos. O reconhecimento de suas qualidades que talvez nem ele conhecesse, constitui o gesto de acolhida que dá partida a uma nova história. Natanael se sente acolhido e amado. É por causa daquele olhar e sobretudo daquele elogio que ele aprende a estimar Jesus e decide de segui-lo. O olhar tem um poder mágico, dizia Rubens Alves. Pode intimidar as pessoas como também pode despertá-las para a vida. Quem é vítima de um olhar amedrontador, preconceituoso ou de desprezo fica retraído e amedrontado. Não desenvolve bem. Ao contrário, o “olhar do coração” dá ao outro a percepção de seu valor. Por isso, precisamos cuidar dos olhos, cultivar a pedagogia e a espiritualidade do olhar para aprendermos a ver como Deus e a dizer como Ele: “Tu és precioso aos meus olhos!”. (Is 43, 4). São Bartolomeu, que teve o privilégio de “ser bem-visto” por Jesus e de ser escolhido como um dos doze apóstolos, interceda por nós para que sejamos fiéis seguidores do Mestre e apaixonados/as colaboradores/as na edificação do Reino de Deus.
(pe. Xavier Paolillo, missionário comboniano)