O Perfume de Betânia tem Cheiro de Ternura
Faltam seis dias para a Páscoa e a atmosfera se enche de perfume. Provem de Betânia, da casa onde mora Lázaro. Jesus foi convidado a jantar para festejar a ressurreição de seu amigo. É uma janta entre amigos/as, pois Jesus precisa de amizade. Procura Betânia para uma pausa de descanso antes de enfrentar o conflito com as instituições de Jerusalém que matam os profetas. É bom poder contar com o apoio de pessoas queridas nos momentos difíceis da vida, sobretudo quando precisa encarar a perseguição.
Enquanto Marta serve os comensais, Maria, ainda uma vez, ajoelha-se aos pés do Mestre, derrama sobre seus pés meio litro de perfume e os enxuga com seus longos cabelos. A casa inteira fica cheia do perfume do bálsamo. A lição de Maria fica gravada na memória do Mestre. Daqui a quatro dias Ele fará a mesma coisa durante a última Ceia. Após tirar o manto e vestir o avental, pegará os pés dos discípulos em suas mãos e os lavará. Ambos os gestos têm a mesma matriz: a ternura. São atitudes que narram aquele Amor sem preço que brota do coração de Deus e se faz serviço. Maria derrama o perfume até a última gota, inclusive, ao soltar o cabelo, ela mesmo se derrama de paixão pelo Seu Senhor, enquanto Jesus vai derramar seu sangue até a última gota. Tudo isso acontece na absoluta gratuidade, somente por amor. Até que enfim Deus e a humanidade passam a se entenderem. Falam a mesma língua. A linguagem do amor sem preço e sem limites. Mas ainda há resistências. Há muitas pessoas que persistem em falar línguas estranhas que seguem as regras da gramática do egoísmo e do ódio. Procuram a casa de Betânia por outros interesses. Uns estão aí só por curiosidade. Querem ver Lázaro ressuscitado. Não estão interessados na pessoa de Jesus, mas em seus milagres. Outros, envenenados pelo ciúme do sucesso de Jesus, só pensam em tramar sua morte. Inclusive, decidem de matar o próprio Lázaro, “porque, por causa dele, muitos deixavam os judeus e creditavam em Jesus “ (Jo 12,11). Enfim, há Judas que reage reprovando o gesto de Maria. Considera-o um ato de puro sentimentalismo. Acha um exagero, inclusive um desperdício de dinheiro. Um pote de perfume daquele tamanho valia pelo menos 300 moedas de pratas. Teria sido melhor vendê-lo para ajudar os pobres. Seu coração não consegue falar a linguagem da gratuidade. Só enxerga interesse. Anima-se somente ao som das moedas. Inclusive, é alérgico à transparência. Disfarça suas reais intenções. Diz-se preocupado pelos pobres, mas está interessado em tirar proveito. João diz que ele, além de ser um traidor, é também um ladrão. Toma conta da bolsa comum, mas usa a função para desviar dinheiro para seu bolso. Sabe o preço das coisas, mas não o valor da acolhida, da amizade e da generosidade. O unguento vale trezentas moedas de prata. Dez vezes a mais daquilo que ele ganhará ao entregar Jesus. A sua preocupação em valorizar o produto só do ponto de vista financeiro acaba denunciando uma dramática desproporção. Enquanto ele trai por um punhado de moedas, Maria está disposta a gastar dez vezes mais para amar (Ermes Ronchi). Na economia do amor, a gratuidade vale mais do que o enriquecimento proprio. Aqui se joga o sentido da vida. Maria, a diferença de Judas, entende que ao amor desproporcionado de Deus só pode se responder com uma excedência de amor. Judas, para disfarçar suas reais intenções, traz como argumento uma suposta alternativa entre Jesus e os pobres. Ainda uma vez não aprendeu nada na convivência com o Mestre. Entre Ele e o pobres não existe alternativa, mas identificação. Quem ama Jesus de verdade não pode prescindir de amar os pobres. E quem ama os pobres de maneira gratuita necessariamente chega a encontrar Jesus em seu caminho. Para quem aposta a vida no Evangelho, Jesus e os pobres vem juntos. Quem se perde nestas fajutas discussões e se obstina a separar o Céu da terra e acredita que quem serve os pobres corre o risco de colocar Jesus em segundo plano não ama nenhum dos dois. Este tipo de argumentação só serve para esconder um déficit de amor o um amor equivocado. A resposta de Jesus é clara: não é para olhar o preço do perfume de Maria, mas seu amor; a prioridade não são as perdas econômicas, mas a generosidade da amizade (Ermes Ronchi). A vida não foi dada para lucrar, mas para ser doada. Quando se investe no Evangelho as perdas de si são lucros. A prioridade não é poupar-se, mas entregar-se.
Neste primeiro dia da Semana Santa, portanto, seguimos o exemplo de Maria e concentremo-nos nos pés de Jesus. Ungimo-los com o óleo do nosso amor. Não se trata de um gesto sentimental, mas comprometedor. Os pés de Jesus são os pés de um Deus que não veio à terra carregado por anjos, mas colocou o pé no chão para conhecer e percorrer os nossos mesmos caminhos, inclusive, o mais dramático de todos: a via que conduz à morte. É um gesto de gratidão e ao mesmo tempo uma promessa de engajamento. “Abraçar seus pés é renovar nosso compromisso de andar pelos seus mesmos caminhos, de seguir seus passos e pisar firme em suas pegadas” (Ermes Ronchi), inclusive na via da sua paixão rumo ao Calvário. Não é fácil. É forte o risco de atolar na lama do pecado, o perigo de cansar e a tentação de desviar do seu caminho. A cruz da incompreensão, da criminalização e da perseguição é sempre pesada. Mas Ele compreende. Dobra-se aos nossos pés, os lava e os acaricia para que voltem a andar atrás dele. Precisamos disso para continuar formes na caminhada. É bom não desgrudar dele custe o que custar. É dessa convivência que vai sair a unção do amor que vai inundar o mundo que habitamos com sua fragrância da vida plena do Ressuscitado.
(Pe. Xavier Paolillo, missionário comboniano)