
O Poder de Curar e Libertar
“Jesus convocou os Doze, deu-lhes o poder e a autoridade sobre todos os demônios e para curar doenças e enviou-os a proclamar o Reino de Deus e a curar os enfermos” (Lc 9,1)
Anunciar o Evangelho não é só dizer, mas também fazer. É cuidar, curar e libertar. Não se trata de fazer de qualquer jeito, mas com poder e autoridade. Escutar estas duas palavras da boca de Jesus parece até esquisito. O verbo que lhe agrada e que deve permear o agir do discípulo é servir. Mas quando está em jogo a dignidade de seus filhos e filhas Ele exige que se aja com poder e autoridade. Não é o poder de mandar e desmandar que tanto fascina o ser humano. É um serviço feito com autoridade. Deus não tolera o desprezo para com a vida humana. Quando se trata de defender seus filhos e filhas intervém com autoridade e quer o mesmo de seus discípulos e discípulas. Não pode haver moleza com as ideologias e os projetos políticos, econômicos, religiosos e sociais que enganam o ser humano, o manipulam, o alienam e o desumanizam. Contra estes “espíritos impuros” não pode haver timidez ou excessiva prudência. Precisa falar e agir com firmeza e franqueza. Não há conversa. Entre eles e o Evangelho não há nenhuma possibilidade de acordo. Jesus veio para acabar com eles.
Não se trata de andar pelo mundo afora despejando baldes de água benta em rituais de exorcismo ou de atrair multidões iludindo-as com curas milagrosas enquanto os “demônios” pintam o sete pelo mundo afora, mas de enfrentar com coragem tudo aquilo que coloca em risco a vida, seu sentido e sua dignidade. Hoje em dia tem “exorcista” demais, mas muitos deles estão a serviço dos “espíritos impuros”. No lugar de libertar seus fiéis, os enganam e os manipulam para subjugá-los melhor aos interesses do demônio. Montam um ‘teatro” para vende um poder que não têm e uma libertação fajuta. Por meio deles agem “os espíritos impuros” que, através da mentira, alienam as pessoas ao ponto de deixar em paz os “demônios” que continuam explorando e saqueando o mundo.
O poder de curar e libertar não é nosso. É dado do alto. Não é uma mania da nossa cabeça. É vontade de Deus. Não é uma invenção ideológica, mas uma verdade teológica. É um poder transmitido por Jesus que, por sua vez, o recebeu do Pai. Vem do Espírito e da Palavra. Não age como os poderes deste mundo que adoperam qualquer meio, inclusive, a mentira e violência, para alcançar seus propósitos. E não se confunde com curandeirismo e charlatanismo. É o poder desarmante do Evangelho que, quando é anunciado com fidelidade e acolhido na sua integralidade, por si mesmo, é capaz de colocar para fora do ser humano e das estruturas sociais, religiosas, políticas e econômicas tudo aquilo que vai contra os valores do Reino de Deus. O Evangelho de Jesus tem o poder de libertar e transformar integralmente. É esta a cura e a libertação que precisamos procurar. Aonde chega, quando é acolhido e seus valores são assimilados, só então cura e liberta de verdade. Humaniza. Mais Evangelho de Jesus Cristo significa mais vida, mais verdade, mas conscientização, mais justiça, mais paz, mais solidariedade, mais acolhida, mais misericórdia… É dessa certeza que nasce a urgência de anunciá-lo. A sua credibilidade aos olhos das pessoas depende também do nosso testemunho. É a coerência da nossa vida que reveste de autoridade aquilo que falamos. Cuidemos dela. O despojamento pessoal, a humildade, a sobriedade, a generosidade e a confiança na hospitalidade do povo são os melhores indícios da autenticidade do/a missionário/a. Cuidado com quem demonstra ganância e acumula riquezas às custas do seu ministério e da boa fé do povo.
Jesus não promete vida fácil. O sucesso não é automático. O/a missionário/a poderá encontrar resistência, rejeição e perseguição. “Os espíritos imundos” não desistem facilmente. O importante é não desanimar e, sobretudo, não se deixar emporcalhar e corromper com a poeira de suas sujas conversas e de suas práticas perversas. Fiquemos em alerta. Se isso acontecer, é bom dar uma sacudida no corpo e no espírito para se livrar dessa poeira contaminada como protesto contra as ideologias que alienam e desumanizam o ser humano e seguir o caminho com a certeza da vitória final. Nada de sujeira. Qualquer que seja o risco e o perigo, não há nada de melhor do que salvaguardar a ‘limpeza” da própria vida e a integridade da própria biografia. “Deixemos Deus conduzir a nossa pequena embarcação; se ela lhe for útil, ele a preservará do naufrágio”, dizia São Vicente de Paulo, cuja memória celebramos hoje. Seu amor pelos mais pobres alimente nossa solidariedade com os/as marginalizados/as e nossa coragem de enfrentar os “espíritos impuros” que os empobrecem.
(pe. Xavier Paolillo, missionário comboniano)