“O que estais procurando?”
A primeira fala de Jesus no Evangelho de João é uma pergunta. A princípio, é dirigida aos dois discípulos de João que passam a segui-Lo, mas, vale para qualquer pessoa que toma a decisão de ir atrás d’Ele. Não precisa entrar em pânico para responder. Jesus não tem nenhuma intenção de testar as competências intelectuais, o nível de cultura e a ortodoxia dos seus discípulos. Não precisa recorrer aos manuais de teologia, nem aos “universitários” nem tampouco ao Google para responder. Não é uma pergunta que exige doutorado. É um questionamento que, antes de mobilizar a inteligência racional, cutuca o coração. Por isso, é acessível a todas as pessoas. Cuidado, porém, ao falar de coração, não significa que estamos no âmbito dos meros sentimentos. “O coração designa toda a pessoa na unidade de sua consciência, sua inteligência, sua liberdade; o coração, além de ser a esfera de afetos e sentimentos, é a sede da memória, pensamento, decisões, operações, escolhas e projetos humanos. Resumindo, tudo é decidido com o coração. Representa a vida humana em sua totalidade” (Enzo Bianchi). Jesus não quer proporcionar fortes emoções ou sentimentalismos baratos. “Que procurais é uma pergunta que vai direto ao coração para questionar os seus desejos. Jesus, mestre do coração, conhece muito bem o ser humano. Sabe e reconhece a importância do desejo e é justamente este o âmbito que quer provocar com suas indagações. Procurar é a ação de quem vai atrás do que falta. É o verbo que nasce da experiência do vazio e é impulsionado pelo desejo de preenchê-lo. O ser humano é assim. É um ser de desejos. É incompleto. Vai se fazendo ao longo da vida. É um conjunto de presenças e ausências, de riquezas e carências, de conquistas e desejos. Já é, mas deseja ser mais. Esse desejo é essencial. Foi o próprio Criador que pôs em nós a “ânsia” de “ser mais”, a “fome do céu”, a “sede de plenitude”. É tudo natural. Quem não o sente ou faz de tudo para sufocá-lo ou desviá-lo para o objeto errado, acaba com a beleza da vida. Cai na armadilha da chatice, monotonia, mediocridade, depressão, apequenamento e banalização (Ermes Ronchi). O questionamento de Jesus atinge justamente este ponto. O que mais desejamos acima de tudo em nossa vida? O que nos faz ser mais? O que, de fato, preenche nosso vazio e dá sentido e plenitude em nossa vida? Desejar não é pecado. O desafio está no objeto do desejo. O problema consiste em saber e procurar quem e o que efetivamente nos garantem o “ser mais”.
O que procuramos quando decidimos seguir Jesus? O que desejamos? Sossego, tranquilidade, sucesso, prestígio, carreira, status social, milagres, curas, libertações, prosperidade? Por incrível que pareça, é o desejo e seu objeto que vão desmascarar as nossas verdadeiras intenções. O outro dia recebi um telefonema de um jovem que está fazendo um discernimento vocacional. “Qual é o hábito religioso que vocês usam?”, me perguntou logo de cara. Nada contra. Mas confesso que fiquei triste pela pequenez de seu desejo. Jesus não pede nada disso. Não exige renúncias ou penitências, não impõe sacrifícios sobre o altar do dever ou do esforço, pede acima de tudo para ir até Ele, para fazer comunhão com Ele e afinar os nossos desejos com Seus (Ermes Ronchi). Ele, com seus questionamentos, nos oferece a oportunidade de entrar no nosso coração, compreendê-lo, conhecer aquilo que mais desejamos e descobrir que Ele é a resposta certa ao nosso desejo de ser mais, o alimento da nossa fome de plenitude e a verdade que nos faz felizes. Na lógica do Evangelho, desejar e procurar o bem do/a outro/a é o caminho da realização e da plenitude da vida.
(pe. Xavier Paolillo, missionário comboniano)