
O Que Tu Queres?
“Manda que estes meus dois filhos se sentem, no teu Reino, um à tua direita e outro à tua esquerda” (Mt 20,21). O pedido é da mãe de Tiago e João, os dois filhos de Zebedeu. A cena é constrangedora e pouco edificante. Até a linguagem utilizada é inconveniente. O tom é de comando. O verbo utilizado está no modo imperativo. Mas Jesus não se incomoda. Aprecia a sinceridade. Compreende o amor de mãe que deseja o melhor para seus filhos. Em vez de repreender, oferece-lhe a oportunidade de expressar tudo o que está preso em seus corações. Ele gosta de quem é transparente com Ele. Por meio da mãe, Tiago e João expressam abertamente o que pensam e o que sonham, diferentemente dos outros que disfarçam ou sublimam suas pulsões sem coragem de enfrentá-las e resolvê-las à luz do Evangelho. Eles sonham com a glória segundo a lógica do mundo. Desejam poder e reconhecimento. É por isso que deixaram tudo para segui-lo. Em Jesus, sobretudo no poder de realizar milagres e atrair muita gente, veem a oportunidade de sair da invisibilidade e da insignificância da vida que levam para se tornarem pessoas de sucesso. Quem se escandaliza com isso e ousa condenar Tiago e João não está sendo honesto. Na realidade, a mãe deles está sempre grávida e continua dando à luz a sede de poder e de sucesso. Seus dois filhos representam as gerações humanas de todos os tempos, inclusive a nossa. A disputa pelo poder atravessa toda a história e contamina todos os setores da sociedade. Não há grupo religioso, político, econômico e social que, mais cedo ou mais tarde, não levante a questão do poder e da carreira. Parece que não seja possível estar na vida e passar por ela sem tirar vantagem para si mesmo, sem brigar pelos próprios interesses, sem guerra, gratuitamente como o filho do homem que não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida. (Antônio Savone).
Jesus não despreza Tiago e João e seu “sonho de grandeza”. Não é pecado desejar ser grande e fazer coisas grandes. Afinal, como reconhece Maria, “grandes coisas faz em nós o Todo-poderoso”. Deus não nos fez para a mediocridade e a banalidade. A nossa vida é uma pérola preciosa que não pode ser dada em pasto aos porcos. “Nós trazemos um tesouro em vasos de barro”, diz o apóstolo Paulo, “para que todos reconheçam que esse poder extraordinário vem de Deus e não de nós” (2Cor 4,7). Ele nos predispos para voar alto e navegar em águas mais profundas. O equívoco se dá no conceito de grandeza e de glória. Tiago e João conhecem a glória do mundo, aquela que se conquista passando por cima de tudo e de todos. Segundo a mentalidade comum, para alimentar o sonho de grandeza é preciso ser agressivo, conquistador, dominador e predador. “Mas, entre vós – alerta Jesus – não deverá ser assim”. Essa não é a glória. É vanglória. Para Deus, glória (em hebraico Kavód) não tem nada a ver com poder e sucesso. Conforme nos ensina Jesus de Nazaré, glória é caráter, peso, consistência e beleza. O que dá consistência a Deus e é fundamento da Sua beleza e grandeza é Seu amor sem limites que se revela concretamente no rosto de Jesus de Nazaré. Portanto, para conhecer a glória de Deus, precisa contemplar a Sua face, sobretudo na hora da cruz, quando o amor se revela em sua plenitude. Ele é o Filho do Homem por excelência, o modelo de pessoa bem-sucedida, porque resistiu ao poder diabólico deste mundo e se fez servo. Um bom discípulo se confronta continuamente com Ele e não tem medo de se deixar questionar por Ele o tempo todo. Não dá para perdê-lo de vista. Quando isso acontece, a sede de poder invade nossos ambientes e destrói as relações fraternas por meio da competição acirrada. Jesus é o único Messias que entra em Jerusalém desarmado, montando num jumentinho e não numa máquina de guerra. Não traz insígnias de comando nem veste paramentos luxuosos, mas espolia-se das prerrogativas divinas para vestir o avental. Não corre atrás de cargos, mas de serviços. Dobra-se aos pés dos discípulos. Aponta o serviço como estilo de vida bem-sucedido. Não acaba com a competição, mas reverte seus termos. Crescer na vida é saudável, mas, na lógica do Evangelho, o progresso não se dá pela subida, mas pela descida; não acontece pela luta fratricida, mas pela solidariedade e a comunhão fraterna. O poder rebaixa. O serviço enaltece. Ganha na vida não quem coloca os outros sob seus pés, mas quem se coloca aos pés dos outros, quem se abaixa e serve como o Mestre. A melhor competição, portanto, não é aquela que faz de tudo para eliminar os adversários, mas a união de todos em busca do bem comum. É nela que o cristão é chamado a se envolver.
Não sei se Tiago e João ficaram satisfeitos com a resposta de Jesus. Talvez, naquele momento, tenham ficado sem entender. De qualquer forma, confiaram Nele e permaneceram com Ele. Como Jesus previra, um dia experimentaram tudo isso em sua pele e alcançaram a glória prometida por Jesus. Sua fama de santidade chegou até nossos dias, contagiando muitas pessoas que buscam a “glória” na identificação com o projeto de vida de Jesus de Nazaré. Vamos falar deles. É bom apresentar à comunidade, sobretudo às crianças, aos adolescentes e aos jovens, personagens que se distinguem pelo seu amor a Deus, sua dedicação aos outros e seu espírito de serviço. No contexto de violência onde a vida é tirada com força, faz bem falar de quem doa a vida. Estamos cansados de conhecer personagens que se tornam famosos por causa da violência, a arrogância, a mentira, o poder, a depredação e a guerra. Queremos conhecer quem vive servindo, espalha o bem e vem fazendo história vivendo a fé, exercendo a caridade e esperançando. As novas gerações precisam de “seres humanos” que, com zelo apostólico e combativa ternura, anunciam o Evangelho da alegria e da paz. É isso que queremos.
(Pe. Xavier Paolillo, missionário comboniano)