Páscoa, Madalena mostra que só o Amor leva à Ressurreição
O testemunho de Maria Madalena, em Jo 20,1-9 mostra que, diante da morte somente a via do amor pode vencer o medo, para levar à ressurreição e à vida nova. Essa é a realização do sonho de Deus para todas as suas filhas e filhos. Madalena, quantas pessoas ainda estariam se nós, com você, rompêssemos o silêncio da covardia…
Coube a você, Maria Madalena, a honra de ser a primeira testemunha da Ressurreição. Foi a partir de você que o anúncio desse grande evento ganhou o mundo. Não poderia ter sido diferente. A paixão pelo Mestre manteve você acordada e vigilante durante a noite toda. Não permitiu que a preguiça tomasse conta da sua vida e os trágicos eventos daqueles últimos dias colocassem em xeque sua fé.
O amor daquele dia em que conheceu Jesus e decidiu segui-lo por toda a vida não poderia ter tido os dias contados. Você sabia que ia durar para sempre e que ia ser mais forte que a morte. Nada e ninguém poderia tê-la separada do seu calor. No momento mais sombrio da sua vida foi a única coisa que a consolou. Nem mesmo a crueldade daqueles que crucificaram seu Mestre conseguiu matar dentro de você a ternura com a qual você foi recebida e amada pelo Seu Senhor.
O amor recebido em dom da parte do Mestre a arrancou da cama de resignação e a colocou em pé. Não deixou que a dor a esmagasse sob seu peso insuportável e lhe arrancasse a vontade de viver. Deu-lhe força para enfrentá-lo com dignidade. Você ressuscitou do desespero no mesmo instante em que o Seu Senhor estava ressuscitando da morte. Você nos ensinou que “a ressurreição é mais para os vivos do que para os mortos” (Paolo De Martino). Você sabia que não tinha que esperar para morrer para viver como ressuscitada. O amor recebido pela graça de Deus e acolhido através de sua conversão já a introduzira na vida do Eterno que não conhece ocaso.
O amor não só lhe devolveu o desejo de andar, mas também lhe deu fôlego para correr. Você correu de sua casa para a túmulo, do túmulo até o Cenáculo onde os apóstolos estavam trancados por medo de passar pelo mesmo triste destino do Mestre. Você correu como Maria que, logo após o anúncio do Arcanjo Gabriel, dirigiu-se apressadamente para a casa de Isabel. Ambas tinham uma notícia que não podia esperar, uma alegria que não dava para conter, mas que precisava ser extravasada. Maria correu, apesar das pedras e da subida íngreme da estrada, e você correu, não obstante a noite ser ainda imersa nas trevas. O amor contém uma energia incontrolável. Ele é excêntrico e gosta de exceder. Aumenta dando a si mesmo, cresce à medida que é compartilhado. Não para diante de nenhum obstáculo, não cede a nenhuma pressão, resiste à dor, não foge diante de decepções, não desiste nem mesmo frente à violência e resiste à morte. É assim o amor que tem qualidade divina. Vem como um presente do Pai. Jorra do coração transpassado do Crucificado.
Quando chegou ao túmulo, só viu a grande pedra retirada e foi o suficiente para você correr ainda mais. Você não podia deixar de contar o que viu. Seu silêncio teria sido trágico. O mundo teria permanecido nas mãos da morte para sempre e os algozes teriam continuado a dormir tranquilamente. Mas você não queria ficar calada. Decidiu correr para contar. Você nunca imaginou que o seu testemunho mudaria o mundo. Sua coragem denuncia nosso silêncio. Quantas vidas ainda estariam vivas se nós, como você, rompêssemos o silêncio da covardia e ressuscitássemos de nossa omissão e indiferença.
Seu amor também abalou a comunidade dos apóstolos. Você os despertou da sonolência e os forçou a sair da toca de seus medos. Colocou-os de volta para a rua. Dirigiu-os no caminho certo, não da fuga. Mandou que parassem de choramingar forçando-os a encarar a realidade e a interpretá-la à luz da Palavra do Mestre que ouviram tantas vezes, mas que não tinham ainda entendido. Chegara a hora de verificar a autenticidade da fé. Isso vale também para nós. A cruz está posta e nós podemos vê-la. Está sob os olhares de todo mundo. Ninguém pode negá-la. Hoje em dia sentimos seu peso como nunca. Tem uma posição de destaque em nossas vidas que se desenrolam à sua sombra. Anunciadores a promotores de tragédias tem aos montes. Tem inflação de morte em contraposição a um déficit de vida. Cadê a fé na Ressurreição? Por onde andam suas testemunhas? O mundo está precisando de pessoas como você, Maria Madalena. Necessita de “ressuscitados e ressuscitadas” que acordem dessa morte aparente que mata tanto quanto aquela real, despertem da letargia, saiam do túmulo da resignação, do medo, da covardia, da fuga, da omissão e do silêncio, reajam à cultura da morte que impera sem controle e testemunhem à luz da Ressureição o primado da vida.
Bem-aventurada você, Maria Madalena, que conseguiu puxar para fora a comunidade dos apóstolos ainda abalados pela via dolorosa para mostrar-lhes o caminho luminoso da ressurreição. Você foi capaz de unir os idosos e os jovens, botou para correr juntos o velho Pedro e o jovem discípulo que Jesus amava. Você se tornou ícone da coragem profética de homens e mulheres que, como você, ainda conseguem questionar as estruturas eclesiásticas que sucumbem à tentação da burocracia e esquecem o ardor missionário e o frescor do Evangelho.
Você conseguiu levantar Pedro prostrado por sua traição. Apenas algumas horas antes, na frente da mulher que o havia denunciado como discípulo de Jesus, ele havia declarado que não o conhecia. Na realidade, aquela mentira continha uma verdade. Ele, de fato, não o conhecia. Apesar de sua convivência com o Mestre, custava-lhe entendê-lo. Assim como não o entendemos apesar de nossas devoções e práticas religiosas. Muitas vezes, como Pedro, pretendemos dizer como Jesus deve agir ou assumimos o papel de juiz em seu lugar. Pedro terá que esperar o encontro com o Ressuscitado para se submeter à única prova que avalia nosso grau de entendimento. Por três vezes, tantas quantas as vezes que o renegou, ele será convidado a declarar seu amor a Jesus. É a partir desta declaração de amor, e não de um ato institucional burocrático, que a Igreja nasceu para ser no mundo o sacramento do amor de Deus.
Imagino você correndo como uma louca querendo abrir o caminho para Pedro e o discípulo amado. Este, por ser mais novo, chegou antes de Pedro, mas o deixou entrar primeiro. Seu testemunho nos dá uma bela imagem da Igreja na manhã de Páscoa: “somos aqueles que sabem esperar, porque temos ritmos diferentes. A fé no Ressuscitado é uma experiência que é feita em conjunto, nunca sozinhos. É uma corrida aonde alguém chega primeiro, mas todos tem paciência para esperar uns pelos outros. O coração do discípulo amado sempre chega antes da autoridade de Pedro, mas ele sabe respeitá-la e esperá-la” (Paolo De Martino). Como seria bom resgatar essa dimensão comunitária, apesar do distanciamento físico. Como seria bonito provar o gosto de estarmos juntos novamente, acolhendo-nos reciprocamente, integrando as diferenças, respeitando uns aos outros, tratando-nos todos como irmãos e irmãs, membros de uma família, a começar pelas nossas comunidades.
Pedro entrou no túmulo e viu, mas não se diz que acreditou. Mais uma vez, o testemunho da fé na Ressurreição é prerrogativa daqueles que se sentem amados e amam por sua vez. A inteligência do coração chega antes daquela que gosta de calcular tudo racionalmente. O discípulo entrou, viu e acreditou. Sucedeu a mesma coisa que aconteceu com você, Madalena. À fé na Ressurreição só se chega pelo caminho do amor. Como diz um antigo ditado: “os sábios caminham, os justos correm, mas só os amantes voam”. O discípulo amado viu as mesmas coisas que todos viram, mas as viu de forma diferente. Ele viu com a inteligência do coração, à luz de Deus. É como a mãe que, apesar de estar na frente de um dependente químico, ainda reconhece um filho para amar. Ou como aqueles que ainda vislumbram irmãos e irmãs naqueles e naquelas que o machucaram.
Obrigado, Madalena, porque com sua corrida louca de amor, você nos levou do Calvário da crucificação para o túmulo vazio da Ressurreição. Estamos precisando de fazer essa viagem da esperança. Somos gratos porque você nos fez entender que o Gólgota é uma parada temporária (Dom Tonino) e a cruz uma etapa de passagem, mas que nosso destino é a vida em plenitude que vem da Ressurreição. Com sua ousadia você nos transportou do caminho escuro da dor para a via luminosa da alegria e indicou o amor como o único meio para chegar o mais rápido possível. Ajude-nos para que nós também possamos, nestes dias tristes de paixão, indicar, através do nosso amor, da nossa solidariedade e do nosso compromisso pela vida, o caminho da alegria da ressurreição para aqueles e aquelas que se sentem abandonados/as por todos, que estão desesperados/as e não conseguem reagir, que lutam para se libertarem da depressão, que encaram uma dependência química, que vivem esmagados/as sob o peso da dor, que perderam tudo e foram atingidos/as pelo luto. Que o Cristo Ressuscitado nos ensine que não há morte para aqueles e aquelas que decidem amar até as últimas consequências assim como Ele nos ama. Aqueles/as que amam não perdem nada, nem mesmo a vida. Pelo contrário, a encontram em plenitude. A alegria da Ressurreição só se alcança pelo caminho do amor assim como só conseguiremos vencer a pandemia pelo cuidado recíproco e por uma inadiável e inegociável opção pela vida. Santa Páscoa transbordante de vida nova, de amor consolador, de paz restauradora e de alegria intensa. Deus diga bem de todos nós.
(pe. Xavier Paolillo, comboniano em S. Rita-PB)
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