Prioridade amazônia: a presença comboniana em Piquiá de Baixo
350 famílias, mais de 1000 pessoas, formam o bairro de Piquiá de Baixo, no estado pré-amazônico do Maranhão.
Nascido nas décadas de ‘60 e ‘70, o bairro é um dos primeiros da cidade de Açailândia. Assim como o bairro, também a comunidade católica é uma das primeiras a se formar na cidade. Os antigos moradores do bairro falam de uma terra rica de agua, farta para o cultivo, a caça e a pesca.
A vida mudou quando a localidade foi marcada pelos grandes projetos de mineração, a passagem da Estrada de Ferro Carajás e a instalação do polo siderúrgico de Açailândia. As indústrias invadiram as terras e se instalaram no quintal das casas, sem pedir permissão, com a falsa promessa de empregos e prosperidade para todos. Aquela que era uma terra “onde corre leite e mel” hoje é uma terra estéril, suja, poluída, onde mais ninguém quer morar e quem fica acaba adoecendo ou morrendo.
Os Missionários Combonianos acompanham Piquiá de Baixo desde os anos ’90, mas se dedicaram com força à causa socioambiental dessa comunidade há cerca de 8 anos. A metodologia de serviço missionário junto à população local tem como princípio-base a inserção, presença encarnada e escuta constante da comunidade, celebrando com ela e lutando ao lado dela pela solução dos problemas. Decidiu-se coletivamente que a luta seria por um reassentamento coletivo em terra livre de poluição e boa para a vida comum. E que a denúncia contra as violações da mineração e da siderurgia não pararia até que as empresas não mudassem radicalmente seu modelo de produção.
A comunidade comboniana vive dentro do bairro de Piquiá, partilhando portanto as mesmas condições de poluição e conflitos sofridas pelos outros moradores. Isso obriga os combonianos a assumir em primeira pessoa o acompanhamento dos vários casos de violações de direitos: não tem como se isolar ou ignorá-los.
Os missionários têm ajudado, nos anos ’90, à fundação de um Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos na cidade. Mais recentemente, em 2008, os combonianos criaram a rede Justiça nos Trilhos, que oferece às comunidades atingidas por mineração assessoria jurídica, educação popular e instrumentos de pesquisa, comunicação e busca de alternativas ao modelo econômico hegemônico.
A aliança dos missionários com o Centro de Defesa e com a rede Justiça nos Trilhos tem permitido oferecer à população de Piquiá de Baixo um apoio consistente para suas denúncias, reivindicações e sonhos. Uma das estratégias mais eficazes é aquela dos intercâmbios entre comunidades atingidas: valorizando a pedagogia de Paulo Freire, estimula-se a auto compreensão da realidade a partir do ponto de vista de diversas comunidades oprimidas que se encontram, reconhecem o que têm em comum e se empoderam a partir da reflexão conjunta.
A missão em defesa da vida e dos direitos humanos precisou logo interagir de maneira constante e competente com as diversas instituições de defesa dos direitos coletivos, nas diversas esferas local, nacional e internacional. A igreja demonstra assim a necessidade de complementar sua missão evangelizadora com a colaboração de outras instituições e a assessoria de profissionais, em muitos casos motivados pela mesma fé e testemunhas de escolhas de vida e serviço até mais radicais que as nossas.
O carisma comboniano e suas articulações internacionais tem permitido, entre outros esforços, oferecer grande visibilidade ao conflito de Piquiá de Baixo e à sua história de libertação, por muitos comparada a um êxodo ou, como diz Papa Francisco, a um “buscar juntos caminhos de libertação” (LS 64). A história de Piquiá de Baixo tem inspirado diversas reflexões bíblico-pastorais, recentemente publicadas no livro “Igreja e Mineração” e articuladas com o movimento maior da igreja latino-americana na defesa da Panamazônia.
Assim, a igreja se posiciona com coragem na denúncia do atual modelo de desenvolvimento predatório e “insuportável”, como o definiu Papa Francisco. Em nosso contexto local, as igrejas de todas as dioceses do estado do Maranhão celebraram exatamente a Piquiá de Baixo a Romaria da Terra e das Águas, com a presença de mais de 10mil pessoas reafirmando a urgência do cuidado de nossa casa comum.
A Província do Brasil renova assim sua prioridade “Evangelização e Amazônia”, na defesa da justiça socioambiental e na promoção das populações mais fragilizadas, indígenas e afrodescendentes que habitam e protegem os territórios.