Salvos/as por um Fio… De Cabelo
Enquanto algumas pessoas admiravam o templo que era enfeitado com pedras preciosas e ofertas votivas, Jesus disse: “Dias virão em que não ficará pedra sobre pedra. Tudo será destruído… Antes que essas coisas aconteçam, sereis presos e perseguidos; sereis levados diante de reis e governadores por causa do meu nome. Essa será a ocasião em que testemunhareis a vossa fé… Não planejeis a própria defesa com antecedência, porque eu vos darei as palavras tão acertadas que nenhum dos vossos inimigos vos poderá resistir ou rebater… Sereis entregues até pelos próprios pais, irmãos, parentes e amigos. Todos vos odiarão por causa do meu nome. Mas vós não perdereis um só fio de cabelo da vossa cabeça. É permanecendo firmes que ireis ganhar a vida.” (Lc 21,5-19).
Eis a grande batalha, o conflito que tem o poder de decidir o destino do mundo e da humanidade. De um lado impera a violência, legitimada pela mentira, atiçada pelo medo e armada até os dentes, pronta a silenciar quem ousa desmascará-la, a matar quem atrapalha seus planos e a destruir tudo aquilo que encontra no seu caminho. Do outro lado, resiste quem se obstina a permanecer humano. Seu plano de vida é o cuidado. Sua estratégia é a ternura combativa. Sua missão é enxugar as lágrimas, curar as feridas da terra e das pessoas, arrebentar as correntes e ajudar a construir percursos de justiça e paz. Permanece onde está, mesmo se o contexto lhe é hostil. Não se acomoda na neutralidade. Não se refugia no vitimismo. Não foge nem se rende à violência. Encara sem agredir. Abatido/a se levanta. Atacado/a com afirmações e atitudes delirantes, responde com argumento sólidos. Odiado/a até dentro de sua própria casa e na sua própria igreja, prioriza a sua fidelidade ao Evangelho de Jesus de Nazaré. Criminalizado/a, faz do banco dos réus a oportunidade para testemunhar sua fé. Acusado/a de “ideologizar” o Evangelho, desmascara a ideologização da fé, a manipulação da Palavra e a instrumentalização da religião que se escondem atrás de práticas religiosas e devocionismos aparentemente “ortodoxos”. Questiona não para se defender, mas sempre em vista do interesse das pessoas marginalizadas. Não busca convencer na base do grito, mas comprova com seu testemunho. Não cansa de procurar humildemente a verdade e toma seu partido. Não vende seu silêncio em troca de cargos e favores. Na dúvida, escolhe sempre o/a empobrecido/a, o humano contra o desumano. Sua maior força é a perseverança. Não desiste fácil. Está disposto/a a ir até às últimas consequências quando se trata de defender a vida.
A história está cheia de mártires que vão além da própria fragilidade e ousam a paz, a justiça e o amor. A sua perseverança é um dom de Deus. Nasce da certeza de que o Pai não os abandona. Por quanto caótica e dura seja a realidade de violência, sempre contam com o olhar paterno e materno de Deus. Enquanto a violência coloca a prêmio a sua cabeça, Deus cuida deles ao ponto de não permitir que se perca um só fio de cabelo de suas cabeças, pois cada fragmento de seus corpos que tombam sob os golpes da violência é semente de vida e esperança que frutifica na terra. Seguindo seu exemplo, firmemos o pé e levantemos a cabeça. Maior é a nossa fragilidade e maior é a Graça que nos revigora. Quando prevalece o cuidado, o humano sai ganhando. É permanecendo firmes no amor, na misericórdia e na ternura que iremos ganhar a vida. Como dia São Oscar Romero, “Há um critério para saber se Deus está perto de nós ou se está longe: todo aquele que se preocupa com o faminto, com o maltrapilho, o pobre, o desaparecido, o torturado, o prisioneiro, com todos esses corpos que sofrem, está perto de Deus. ‘Chamarás o Senhor e ele te escutará’. A religião não consiste em rezar muito. A religião consiste nessa garantia de ter meu Deus perto de mim porque faço o bem aos meus irmãos. A garantia de minha oração não está em dizer muitas palavras; a garantia de minha prece é muito fácil de conhecer: como me comporto com o pobre? Porque ali está Deus”. Coragem. Não arredem o pé. Fiquem firmes até o último dia, não do fim de tudo, mas da vitória.
(pe. Xavier Paolillo, missionário comboniano)